segunda-feira, 4 de maio de 2015

A guerra de Krillin

A guerra de Krillin

(Revisado pela Jessica)

Geralmente jabutis são criaturas mal-humoradas. Convivo com um desses seres desde que minha filha avistou uma inocente "tartaruguinha" exposta numa caixa de papelão numa feira-livre, há doze anos. Eu moro num pequeno apartamento no subúrbio, onde em determinado momento, após a onda dos hamsters, do  cocker spaniel com graves problemas psicológicos que não conseguia andar sem destruir metade do que encostava − e que morderia a própria sombra se ela tivesse mais que duas dimensões − estabilizamos a cota da fauna local em dois Shi-tzus e o jabuti rabugento. Para sua infelicidade o cágado foi batizado quando o anime japonês da série Dragon Ball estava no auge. Chamaram-no de Krillin, em homenagem ao careca baixinho amigo do Goku.

O primeiro shih-tzu chegou na minha casa há uns oito anos.
O segundo, há cerca de um ano e meio. Por alguma ordem cósmica subjacente a realidade metafísica, o primeiro cachorro é um exemplo de docilidade e gentileza. Um príncipe dentre os shih-tzus. O segundo, no entanto, uma cadela, a quinta-essência da infernalidade.
Irriquieta, bagunceira, atroz perseguidora de pombos, lutadora exímia que treina continuamente seus golpes de Krav-Shih-tzu com o coitado do Spik, o príncipe, e sobretudo, inimiga mortal do rabugento cágado.
Não sei exatamente quem deu inicio a guerra; Guerra que já se prolonga há um ano e meio.
Talvez tenha se iniciado depois da incorrigível cadelinha ter tentado arrancar pela enésima vez a cabeça do primeiro animal de estimação habitante do pequeno apartamento, ou tenha acontecido após o Krillin ter empurrado a cadela dormindo numa de suas indesviáveis rotas no interior do apartamento.
Existem, na realidade, estradas ou pistas invisíveis no chão do apartamento, rotas pelas quais o cágado realiza suas incursões diárias para roubar a comida dos cachorros e beber sua água, além de arrastar cadeiras e necessariamente derrubar o violão; talvez, por uma vocação musical incompreendida, ou porque acha divertido, pelo menos nas 123 vezes que o instrumento foi tombado pelo chão. Inclusive, se ele vir o violão em pé em qualquer posição dentro do apartamento é para o infeliz que se dirigirá com o fim de derrubá-lo.
O estressado animal iniciou uma campanha solitária pela expulsão da cadelinha: tem dispendido esforços consideráveis em irritá-la. A questão principal nessa cruzada pessoal – nós– os demais habitantes do apartamento, sofremos arrabalde.
Com o desenvolvimento de suas sinistras táticas de guerra o carapacento animal aprendeu a desligar ventiladores puxando-os da tomada. E num momento de genialidade, desconfiando do tempo que ficávamos diante dos monitores dos computadores na sala − a suprema ofensa − aprendeu, criatura autodidata, a desligar o provedor da internet desconectando o fio que liga o modem á rede telefônica. Não satisfeito, aprendeu a desligar após, também, o computador.

Sim. Já imaginamos qual seria o gosto da sopa de tartaruga ou em usar a carapaça do animal para construção de um exótico bandolim, mas votamos pela pena de prisão domiciliar. Quando ficamos cansados de ouvir suas patinhas arrastando no chão tentando mover o sofá encostado na parede, contra a parede, colocamo-la no box do banheiro e fechamos a porta. Infelizmente os recursos ilimitados dessa criatura mutante foram, incompreensivelmente, subestimados. Já deveríamos estar acostumados.
O jabuti aprendeu a abrir a porta do Box.

E a guerra de Krillin continua...

Welington J F
.
A

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