Das profundezas
Baseado em certa mudança de andar de antiga equipe de uma empresa brasileira...
A ata de reunião que decidia a mudança de andar da galera de estimativa de custos foi despachada perto da meia-noite. A tradicional reunião de reorganização anual do prédio em que ficavam os departamentos de Engenharia fora realmente, muito tensa. Três comitês e doze propostas foram agressivamente debatidas pelo grupo gerencial por quase três horas. A crescente taxa de ocupação do prédio, assim como as alegações de futuras demandas de pessoal, em função do crescimento exponencial da empresa, geraram a necessidade de soluções de alocação de gente realmente radicais. Para otimização de custos, o prédio também reunia, além de Servidores de Dados da empresa, vasta rede de laboratórios. Incluindo um especial de geologia das profundezas - Criado para estudos sísmicos - Resumindo a dita reunião, por apertadíssima votação, venceu a proposta de colocar a equipe de Estimativa ao lado do dito laboratório.
O laboratório ficava cerca de 23 Km de distância. Linha reta em direção ao centro da terra.
Sim.
A vinte e três quilômetros de profundidade.
O gerente do setor de Estimativa de Custos tremia ao ler a ata de reunião. Uma secretária desmaiou com a notícia e um dos orçamentistas do grupo teve uma súbita queda de pressão arterial. O prazo para mudança era de três dias. O gerente ainda tentou negociar. A outra opção também não era muito vantajosa. A equipe não foi informada sobre a segunda possibilidade, mas não ousou perguntar em virtude do olhar aterrorizado do gerente setorial.
Às sete horas da manhã de uma quinta-feira, sete pessoas entraram com suas caixas repletas de papeis no elevador – 76 (Menos Setenta e Seis). Tinha um ascensorista que os olhou com muita compaixão quando o grupo, formado de três homens e quatro mulheres, entrou no elevador. “–76” significava: “setenta e seis andares negativos”. A descida não demorou tanto quanto o esperado. A expectativa na abertura da porta do elevador era intensa, alguns engoliam em seco. As portas se abriram a setenta e seis andares abaixo da linha do solo. Havia ali um longo corredor e uma vasta rede de tubulações. As paredes eram absolutamente escuras, talhadas na rocha, na maioria de sua superfície estava coberta por fina camada líquida e quente de água de estranho aspecto. No final do lúgubre corredor havia uma espécie de trem suspenso por grossos cabos. Possuía oito lugares. Certa voz metalizada solicitou que colocassem os cintos de segurança enquanto as cabines eram cobertas automaticamente por vidros esfumaçados. Os cabos tensionados começaram a tremer e com um impulso fenomenal o veículo começou seu movimento espectral. Para baixo e avante. Aos quatrocentos km/h a estrutura do bólido rangia como fosse se partir. Talvez fosse. Porém, suportou bem a desaceleração. Viu-se a plataforma que estava suspensa sobre um determinado abismo na primeira parada. As portas se fecharam após a passagem do pequeno veículo e um sistema de pressurização ruidoso entrou em funcionamento. Dois operadores da “Passagem para o Abismo” como eles chamavam a estação de transferência, vestidos com roupas especiais, para suportar altas temperaturas, recepcionou o a equipe desconfiada. O grupo vestiu também roupas especiais, monidas de capacetes transparentes que encobriam toda a cabeça, como escafrandos, enquanto ouviam uma assustadora palestra de segurança que os ensinava a utilizar o suporte de vida do traje, em caso de emergências. Certo alarme começou a ecoar e atrapalhar a palestra, mas o auxiliar de segurança da “Passagem” continuou sua dissertação como se nada estivesse ocorrendo. Foram conduzidos até um elevador de carga. Com porta pantográfica. Vestidos como astronautas desceram cerca de 800 metros até a passagem numero 2, onde um mecânico de manutenção os aguardava. Passaram por centenas de tubos suspensos e uma nuvem de vapor os cobriu na entrada do “Mergulhador”. Mergulhador era o nome do veiculo que descia verticalmente até o setor 23. Tinha uma aparência estranha, com partes azuladas do metal, algumas tubulações de aço, doze eletroímãs espalhados com bobinas feitas por barras de buckypaper (vinte vezes mais forte que o aço). O fato é que o Mergulhador era basicamente uma liga de titânio e tungstênio. Os imãs serviam para acelerar, frear e impedir que veículo encostasse-se às paredes do túnel na hora de descida. As portas do veículo se abriram, mas ninguém ousou entrar. Até que ouviram a primeira explosão. Alguma coisa havia explodido, e o que quer que fosse fez a plataforma tremer. Assustados entraram e o veículo deu início, após travar as portas a seqüência de lançamento negativo. Uma das moças da equipe levou a mão à boca e disse:
- Acho que vou...
Não teve tempo de terminar a frase... O veículo abruptamente se deslocou. Então entenderam porque o chamavam de mergulhador.
Havia um termômetro digital que marcava 230 graus na parede do veículo. Uma das tubulações hidráulicas internas começou a vazar, quando o mecânico que estava a bordo começou a bater nos tubos com uma enorme chave inglesa. O marcador de pressão a esquerda chegou no vermelho quando as luzes de alerta próximas ao teto da cabina se acenderam. O ruído da desaceleração foi ensurdecedor. Havia janelas ou escotilhas que iniciaram a trincar à esquerda e a direita dos assustados membros da equipe. Então a porta de acesso abriu, e por um instante todo o interior da cabine se tornou avermelhada, no instante da pressurização...
São três horas da tarde. Sete pessoas assustadas saltam no primeiro andar enquanto o ascensorista do -76 lhes sorri, com oportuna afeição. As caixas haviam queimado na abertura da porta do Mergulhador, por sorte o mecânico conseguiu reaver o comando do módulo... Uma das integrantes larga no chão uma caneta bic derretida.
O ascensorista sorri e lhes acena:
- Até amanhã!!!
Então, as portas do -76 se fecham.
Baseado em certa mudança de andar de antiga equipe de uma empresa brasileira...
A ata de reunião que decidia a mudança de andar da galera de estimativa de custos foi despachada perto da meia-noite. A tradicional reunião de reorganização anual do prédio em que ficavam os departamentos de Engenharia fora realmente, muito tensa. Três comitês e doze propostas foram agressivamente debatidas pelo grupo gerencial por quase três horas. A crescente taxa de ocupação do prédio, assim como as alegações de futuras demandas de pessoal, em função do crescimento exponencial da empresa, geraram a necessidade de soluções de alocação de gente realmente radicais. Para otimização de custos, o prédio também reunia, além de Servidores de Dados da empresa, vasta rede de laboratórios. Incluindo um especial de geologia das profundezas - Criado para estudos sísmicos - Resumindo a dita reunião, por apertadíssima votação, venceu a proposta de colocar a equipe de Estimativa ao lado do dito laboratório.
O laboratório ficava cerca de 23 Km de distância. Linha reta em direção ao centro da terra.
Sim.
A vinte e três quilômetros de profundidade.
O gerente do setor de Estimativa de Custos tremia ao ler a ata de reunião. Uma secretária desmaiou com a notícia e um dos orçamentistas do grupo teve uma súbita queda de pressão arterial. O prazo para mudança era de três dias. O gerente ainda tentou negociar. A outra opção também não era muito vantajosa. A equipe não foi informada sobre a segunda possibilidade, mas não ousou perguntar em virtude do olhar aterrorizado do gerente setorial.
Às sete horas da manhã de uma quinta-feira, sete pessoas entraram com suas caixas repletas de papeis no elevador – 76 (Menos Setenta e Seis). Tinha um ascensorista que os olhou com muita compaixão quando o grupo, formado de três homens e quatro mulheres, entrou no elevador. “–76” significava: “setenta e seis andares negativos”. A descida não demorou tanto quanto o esperado. A expectativa na abertura da porta do elevador era intensa, alguns engoliam em seco. As portas se abriram a setenta e seis andares abaixo da linha do solo. Havia ali um longo corredor e uma vasta rede de tubulações. As paredes eram absolutamente escuras, talhadas na rocha, na maioria de sua superfície estava coberta por fina camada líquida e quente de água de estranho aspecto. No final do lúgubre corredor havia uma espécie de trem suspenso por grossos cabos. Possuía oito lugares. Certa voz metalizada solicitou que colocassem os cintos de segurança enquanto as cabines eram cobertas automaticamente por vidros esfumaçados. Os cabos tensionados começaram a tremer e com um impulso fenomenal o veículo começou seu movimento espectral. Para baixo e avante. Aos quatrocentos km/h a estrutura do bólido rangia como fosse se partir. Talvez fosse. Porém, suportou bem a desaceleração. Viu-se a plataforma que estava suspensa sobre um determinado abismo na primeira parada. As portas se fecharam após a passagem do pequeno veículo e um sistema de pressurização ruidoso entrou em funcionamento. Dois operadores da “Passagem para o Abismo” como eles chamavam a estação de transferência, vestidos com roupas especiais, para suportar altas temperaturas, recepcionou o a equipe desconfiada. O grupo vestiu também roupas especiais, monidas de capacetes transparentes que encobriam toda a cabeça, como escafrandos, enquanto ouviam uma assustadora palestra de segurança que os ensinava a utilizar o suporte de vida do traje, em caso de emergências. Certo alarme começou a ecoar e atrapalhar a palestra, mas o auxiliar de segurança da “Passagem” continuou sua dissertação como se nada estivesse ocorrendo. Foram conduzidos até um elevador de carga. Com porta pantográfica. Vestidos como astronautas desceram cerca de 800 metros até a passagem numero 2, onde um mecânico de manutenção os aguardava. Passaram por centenas de tubos suspensos e uma nuvem de vapor os cobriu na entrada do “Mergulhador”. Mergulhador era o nome do veiculo que descia verticalmente até o setor 23. Tinha uma aparência estranha, com partes azuladas do metal, algumas tubulações de aço, doze eletroímãs espalhados com bobinas feitas por barras de buckypaper (vinte vezes mais forte que o aço). O fato é que o Mergulhador era basicamente uma liga de titânio e tungstênio. Os imãs serviam para acelerar, frear e impedir que veículo encostasse-se às paredes do túnel na hora de descida. As portas do veículo se abriram, mas ninguém ousou entrar. Até que ouviram a primeira explosão. Alguma coisa havia explodido, e o que quer que fosse fez a plataforma tremer. Assustados entraram e o veículo deu início, após travar as portas a seqüência de lançamento negativo. Uma das moças da equipe levou a mão à boca e disse:
- Acho que vou...
Não teve tempo de terminar a frase... O veículo abruptamente se deslocou. Então entenderam porque o chamavam de mergulhador.
Havia um termômetro digital que marcava 230 graus na parede do veículo. Uma das tubulações hidráulicas internas começou a vazar, quando o mecânico que estava a bordo começou a bater nos tubos com uma enorme chave inglesa. O marcador de pressão a esquerda chegou no vermelho quando as luzes de alerta próximas ao teto da cabina se acenderam. O ruído da desaceleração foi ensurdecedor. Havia janelas ou escotilhas que iniciaram a trincar à esquerda e a direita dos assustados membros da equipe. Então a porta de acesso abriu, e por um instante todo o interior da cabine se tornou avermelhada, no instante da pressurização...
São três horas da tarde. Sete pessoas assustadas saltam no primeiro andar enquanto o ascensorista do -76 lhes sorri, com oportuna afeição. As caixas haviam queimado na abertura da porta do Mergulhador, por sorte o mecânico conseguiu reaver o comando do módulo... Uma das integrantes larga no chão uma caneta bic derretida.
O ascensorista sorri e lhes acena:
- Até amanhã!!!
Então, as portas do -76 se fecham.
Welington José Ferreira
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