terça-feira, 11 de março de 2008

No princípio


Gn 1:1: No princípio criou Deus os céus e a terra. Difícil era parar de brincar. Normalmente anjos sorriem demais. Talvez porque os céus invisíveis sejam um lugar de gozo e paz inefáveis. Ou pelo fato de que a alegria é extremamente embriagadora para quem pode voar. Fazíamos o impossível. Mas, o que será esse tal de impossível? Não existiam trevas na terra onde só existe luz. Chamamos de asas, essas que nos elevavam entre as cores da vastidão da nossa casa. Contava-nos o Senhor, em grandes rodas, quando conseguia a custo nos silenciar, pois se não voávamos, gritávamos... Impressionante é se alegrar diante de sua glória... Mas seus gestos meigos que resplandeciam a cada volta da poderosa mão nos faziam acalmar. Quando as dimensões foram criadas, cada rodopio no qual subíamos para depois repousar... eram como as grandiosas distancias entre as cidades nas quais habitariam os homens do mundo vindouro. Nas festas de cânticos nos gramados imensos, sempre entre os montes gêmeos (um dos únicos lugares onde todos nós... de uma feita... podíamos nos assentar...) cantávamos profecias. Que estava para chegar a expansão da vida sonhada, o outro lugar, lugar da terra e do jardim, onde mundos ficariam suspensos até o tempo determinado pela mão de Deus. Diferente das maravilhas que conhecíamos até então. Novamente sua mão tremenda... erguida e resplandecente, nos conduzia a nos aquietar. Sua voz....Mais que a vida... Ouvir o som de sua voz...

Viver nos era tremendo. Abrir os olhos e perceber e entender e sentir. Ser participante de sua imortalidade e permeado das torrentes do seu poder, como poder explicá-lo? Contudo ouvi-lo quando sua voz se elevava além das alturas das águas que estrondavam num turbilhão infindável, cuja origem era seu trono (nós o chamávamos assim, trono), isso... era... incomparável. Ainda não existia o mover do tempo e mesmo quando se iniciou, passava lentamente quando Ele começava a nos falar. E perguntávamos sobre as asas. O Único nos falava sobre as aves que povoariam os céus da terra que criaria. E dizia que teriam asas como as nossas... E nós ríamos... Ele nos falava dos desertos e dos camelos Das árvores, cujas imensas copas se elevariam às alturas da expansão azul Ele nos falava de águas, numa quantidade tão grande que nela habitariam seres gigantescos. E haveriam faixas prateadas que irromperiam sobre ás águas, que se moveriam em grande quantidade, barulhentas como montanhas que sofriam avalanches. Os homens chamariam as faixas prateadas de raios e o romper das faixas com as quais costumávamos brincar, de trovões.

– Fala-nos sobre os homens! E o Senhor nos contava. E seus olhos faiscavam. Ele seria pouco menor que nós, porém tão amados quanto. Até que o dia da transformação acontecesse. Então seriam feitos semelhantes a nós. E outra vez a confusão estava armada... Ascendendo como incenso o turbilhão, a cada tanger das cordas do coração divino, fazia as estruturas celestiais estremecerem. E nos alegrávamos porque um dos dias para o qual nascêramos era chegado... O Princípio de todas as coisas que seriam visíveis aos olhos do ainda incriado homem, no qual esperanças incompreensíveis seriam depositadas. Sete seriam as vezes que os céus se silenciaram por completo. Esta era a primeira vez. O Senhor pediu silencio. Ele se ergueu acima da sua morada. Com ele subiram os cinco querubins. Nós olhávamos. O Senhor disse:

– O que estais esperando? Vinde!

O silencio foi quebrado pelos bilhões que se erguiam até sua presença. Então pela primeira vez em silencio (que eu me lembre, assim em multidão, talvez a última) fomos com o Senhor até ao lugar determinado. Testemunhamos o nascimento de todas as coisas, quando ele chamou a si do nada, a tudo que existia. Perfeitas como sua face. Então... Não nos contivemos... De novo. Para não perder o costume... Nós, anjos, quando em algazarra, somos a coisa mais ruidosa que a criação possui. Gn:1:2: E a terra era sem forma e vazia; e havia trevas sobre a face do abismo; e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas. Logo depois do cataclisma Era a segunda vez que ficávamos em silencio desde o princípio.

Desta vez não nos aproximamos. Porque o tudo pode parecer tão pouco? Que há além da paz e da harmonia e que importa o poder ilimitado, se não há razão no que se cria? Porque escolher a dor em vez da vida, amargura ao amor, escuridão onde reina a luz? Conhecimento não é sabedoria. Sabedoria sem amor não enriquece seu possuidor. Deus possui sabedoria infinita. Possui conhecimento inimaginável. E bem sabe que o conhecimento não é a melhor ou a maior dádiva. Às vezes, somente um fardo. Somente um fardo. Silenciávamos pela perda de irmãos. De amigos. De seres de grandeza incomensurável. Já não haveria danças como as que aconteciam naqueles dias de outrora. A harmonia fora quebrada. Algumas coisas que já existiam antes dos dias de dor começavam a fazer certo sentido. Sempre perguntávamos o porque do véu na pequena tenda, na qual entravamos, onde havia aqueles pequenos querubins feitos de ouro... Porque havia véu, se víamos perfeitamente através de todas as cortinadas? E diferente das coisas que havia nos céus, aquelas eram feitas de que?

Que era aquele conjunto de coisas minúsculas, cuja estrutura contemplávamos...Os pequenos grãos... forças que caminhavam ordenadas e que sustentavam os pequenos grãos... um dia os homens chamariam essas coisas de átomos... Que de perto eram como o vazio e de longe como o ouro... As trevas se estenderam sobre os horizontes da expansão criada. Quando o cataclismo celeste terminou, nós nos perguntávamos porque Ele não a impediu de todo. Eram suas as cordas que amarram os tecidos da existência. São seus os poderes sustentadores de todas as coisas. O que aconteceu afrontou as cordas e despedaçou as colunas firmadas segundo sua sabedoria. Aquele no qual não habita trevas, agora em Espírito, caminhava sobre sua criação vitimada. O coração caminhava sobre a escuridão. Poderes foram abalados. Um ser criado decidiu contra a decisão. Uma criação permitiu-se amar as trevas mais do que a luz. O caos mais que a vida. Recusou o propósito de eternidade e recusou a vida como profissão. Que cria que o poder devia dominar. Que pensava que a força devia destruir. Que o eterno deveria cessar. Que Deus não era digno do poder incomensurável que nele habitava. Ele preferiu a si mesmo antes de todas as coisas.

Quem poderia medir o seu poder no dia em que enlouqueceu? Um universo inteiro jazia sobre uma destruição premeditada. Destruição contida por um poder ainda maior. Entretanto, se por um momento a semente de vida que Deus espalhou entre os seres celestiais, fosse retomada, se por um momento na sua vontade houvesse uma sombra, um não, um chega, um basta... Que seria do bastardo e de todos nós... Nós entendíamos que de algum modo, pesávamos no seu coração. Por isso nos calamos quando seu espírito pairou sobre a face do abismo. Nós podíamos ve-lo. Somente nós podíamos ver seu espírito. Não queimava sua presença em nossos corações? Sim. Mais forte do que tudo. Ele queimava. Ele queimava. Então o Senhor se aproximou, ele e quatro querubins. Seu espírito envolveu a todos os querubins e ao Senhor. E as faixas prateadas irromperam sobre a nossa multidão.

O Senhor parou sobre a face do abismo. Bem sabia o que iria fazer. Ergueu suas mãos para o alto. Incandesceram as mãos de Deus. Os Querubins incendiaram. Incandesciam os querubins. E os nossos corações queimaram. E a massa informe se movia... Os cordões antes partidos recriados foram todos... e o Senhor nos olhou. E sorriu. Ainda estava erguida sua mão, quando sua voz crispou todas as dimensões e foi ouvida até no seu santuário celestial: - Haja luz

Welington Language Institute

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